*Por Ruy Nogueira — A nova capital era um sonho de Dom Bosco, quimera dos Inconfidentes, transformada em decisão do arrojado JK. Não passava de um borrão de terra vermelha e poeira redemoinhada pelos ventos do planalto central do país. Transformou-se no lar de jovem e belo casal chegado de Belo Horizonte.
Sem saber, Mara e Gilberto Amaral, filhos de famílias aristocráticas das Geraes, se transformariam em símbolo da miraculosa obra surgida das pranchetas de Niemeyer e Lúcio Costa e dos braços dos candangos, encantando o mundo e sendo batizada por Maulraux como a “Capital da Esperança”. Jornalista talentoso e tipo humano inesquecível, cuja generosidade chegava às raias da irresponsabilidade material, Gilberto foi amigo de todos os presidentes da República. Antes, durante e depois do poder.
Foi amigo dos amigos mais inusitados, uma fauna que encantava seu espírito elevado e ia de pessoas às mais humildes aos homens mais poderosos do República. De todos, com sua irreverência, personalidade vulcânica, forte amizade e desconcertante sinceridade. Entre o grito indignado e os olhos marejados os segundos eram poucos. Gilberto tratou da mesma maneira o morador eventual do palácio da Alvorada e o humilde que o procurava em socorro nas agruras diárias – e era atendido por um coração monumental. Por mais de meio século o mais forte e influente jornalista da corte.

Foi, pela vida inteira, um tipo humano bom e solidário. Amigo de longas partidas de biriba do ditador Costa e Silva, coalhava sua coluna com fotos do amigo e padrinho de casamento Juscelino Kubitscheck. E ninguém, ninguém mesmo, ousava tirar-lhe satisfações ou censurá-lo. Gigi elevava a amizade à santidade de um dogma.
A seu lado, Mara, dama delicada, elegante, finíssima, que esconde em sua classe a fortaleza que permitiu-lhes constituir família para lá de boa, harmoniosa e querida. Recebo a notícia de que meu amigo, Amigo com “A” maiúsculo, partiu para a eternidade. E as lembranças assaltam-me à memória como num documentário poderoso, onde o recordo dançando tango em Buenos Aires, para deleite do ex-presidente Sarney, nosso companheiro de viagem; entornando champanhe na minha taça no brunch do The Plaza, em Nova York, com sorriso de menino e visível contentamento; parado na calçada da Avenue Montaigne, em Paris, com Pedro Rogério e Luiz Carlos Chaves, enquanto despachava-me, gargalhando, para dentro da Maison Dior com a querida Mara (“vai lá, porra, você é consumista como ela!”); impedindo que meu filho, então um adolescente, voltasse ao Brasil comigo e ficasse mais uma semana na Europa às expensas do casal.
Gilberto Amaral foi um tipo humano raríssimo, de nobre coração, maior que seus eventuais defeitos, com um sentido absoluto de solidariedade ao próximo. O mundo fica pior sem ele, minha vida fica menos alegre. Adeus, queridíssimo Amigo!
________________________
*Ruy Nogueira é publicitário