Do g1 – Uma mãe denunciou que o filho, um menino de 3 anos com paralisia cerebral, foi dado como morto e passou cerca de cinco horas sem assistência, num hospital particular do Recife. Segundo a dona de casa Laís Lima, o menino, chamado Miguel, foi levado à unidade de saúde na tarde segunda-feira (1º), pálido e com desconforto respiratório. No mesmo dia, foi declarado morto pela equipe de saúde.
Por causa da paralisia cerebral, Miguel se alimentava por meio de uma sonda instalada na barriga, e, apesar de conseguir respirar sem ajuda de aparelho, tinha uma traqueostomia.
O caso é investigado pela Polícia Civil. A mãe conta que, segundo o hospital, o filho teria chegado à unidade de saúde em parada cardiorrespiratória, passando por processo de reanimação. O garoto não teria resistido.
No entanto, após cinco horas da declaração de óbito, já sem a traqueostomia e a sonda e com o suposto cadáver em processo de preparação, a equipe levou o menino à Unidade de Terapia Intensiva (UTI), onde passou mais oito horas, até, de fato, morrer.
O menino morreu no Hospital Infantil Mandacaru, no bairro do Torreão, Zona Norte do Recife. A unidade pertence à rede Hapvida, que, procurada pelo g1, lamentou o falecimento e disse que “o paciente recebeu atendimento imediato e foi assistido integralmente pelas equipes plantonistas”
Segundo o relato da mãe, o menino foi socorrido pela primeira vez no domingo (30), com febre e desconforto respiratório. O garoto passou por exames, foi medicado e liberado. Em casa, ele era assistido por uma espécie de “home care” fornecido pelo plano, com máquinas de suporte respiratório e atendimento por uma fisioterapeuta respiratória.
Na segunda-feira (1º), devido ao quadro de saúde, essa profissional decidiu colocá-lo em suporte respiratório por meio da traqueostomia e orientou que, se o quadro de saúde do menino não melhorasse, a família retornasse ao hospital.
“À tarde, ele teve muito desconforto respiratório e ficou pálido. Com suporte respiratório instalado, fomos a um hospital público, que o transferiu para o Hospital Mandacaru. Lá, disseram que ele chegou em parada cardiorrespiratória e que passaram 26 minutos tentando reanimar, mas que ele tinha morrido. Só nos deram essa notícia mais de uma hora depois”, afirmou a mãe.
Informados da suposta morte do filho, os pais de Miguel foram ver o corpo, que, segundo a mãe, a todo tempo tinha espasmos chamados de “gasps”, que são movimentos de inspiração curta e repentina.
“Eram os mesmos movimentos que ele tinha em casa. Disseram que era um reflexo normal, porque tinham dado muita adrenalina na reanimação e que, mesmo após a morte, o corpo pode ter espasmos. A gente entrava e saía da sala e ele com os mesmos ‘gasps’. Teve uma hora que botei a cabeça no tórax dele e senti batimentos cardíacos. Questionei e disseram que ele tinha batimentos, mas não tinha circulação”, disse Laís Lima.
A mãe contou que o menino passou cerca de cinco horas tendo os reflexos de respiração, e que, nesse período, ele não ficou pálido, estava com o corpo quente e lábios rosados. Mesmo assim, os profissionais continuaram o procedimento de preparação do corpo. A família chegou a filmar o menino tendo os “gasps”, já com o corpo envolto em TNT e algodões nos ouvidos.
“Voltamos à sala e tinham tirado a traqueostomia e a sonda dele, e a ‘traqueo’ estava sangrando. Perguntei ‘como alguém que está morto sangra?’. Aí taparam o orifício com gazes e esparadrapo. Foi aí que uma nova equipe médica assumiu o plantão e, sem dizer nada, os profissionais colocaram Miguel no respirador e levaram ele ao centro cirúrgico para colocar um acesso e aplicar medicação”, afirmou a mãe.
Ainda segundo Laís Lima, após ser posta na Unidade de Terapia Intensiva, a criança se manteve viva até a madrugada do dia seguinte, cerca de 14 horas após ter sido declarada morta. O óbito foi constatado às 4h18 da terça-feira (2).
“Largaram meu filho lá para morrer. Não falaram nem explicaram nada, e, nesse tempo que passou sem assistência, ele sofreu muito, mas lutou muito pela vida. Mas isso agravou o quadro dele e tem uma hora que o coração não aguentou mais”, declarou.
Outro ponto questionado pela família é que, segundo a mãe, o hospital queria levar o menino em ambulância, supostamente morto, para o Serviço de Verificação de Óbito (SVO), órgão público que investigar e esclarecer a causa da morte em casos de óbito natural sem causa definida.
Entretanto, o transporte do corpo deve ser feito pelo próprio SVO, em casos específicos, ou por funerárias particulares, caso a família contrate esse serviço.
“Eu queria saber a causa da morte e o hospital disse que quem levaria o corpo para o SVO seria uma ambulância da Hapvida. Mas quem recolhe corpo é a funerária, e ambulância não leva corpo em óbito. Mas o hospital começou a negar”, disse.
Na quarta-feira (3), a família foi à Delegacia do Espinheiro, na Zona Norte do Recife, para registrar boletim de ocorrência sobre o caso. De acordo com a Polícia Civil, um inquérito foi instaurado para apurar o caso, e “mais informações poderão ser repassadas após a elucidação de todos os fatos”.
O que diz o hospital
Por meio de nota, a Hapvida disse que lamenta profundamente a morte de Miguel, e expressou solidariedade à família do menino. Disse, também, que o garoto foi atendido integralmente pelas equipes de saúde, “que realizaram as intervenções necessárias diante da gravidade do quadro clínico”.
Confira, abaixo, a nota na íntegra:
“O hospital lamenta profundamente o falecimento da criança e expressa sua solidariedade à família neste momento de imensa dor. A instituição reforça que o paciente recebeu atendimento imediato e foi assistido integralmente pelas equipes plantonistas, que realizaram as intervenções necessárias diante da gravidade do quadro clínico. A direção está em contato constante com os familiares prestando todos os esclarecimentos necessários e permanece à disposição.”
