Diversos artistas e intelectuais brasileiros assinam artigo para o jornal britânico The Guardian. Eles defendem que a “Democracia e a liberdade de expressão estão ameaçadas no Brasil”.
Leia a matéria:
O regime de extrema-direita do Brasil quer censurar livros didáticos, espionar professores e reprimir grupos minoritários e LGBTQ +. Precisamos do apoio da comunidade internacional.
As instituições democráticas do Brasil estão sob ataque. Desde que assumiu o cargo, o governo Jair Bolsonaro, ajudado por seus aliados na extrema direita, minou sistematicamente as instituições culturais, científicas e educacionais do país, assim como a imprensa.
No início, membros proeminentes do partido político de Bolsonaro iniciaram uma campanha para incentivar estudantes de universidades e escolas secundárias a filmar secretamente seus professores e denunciá-los por “doutrinação ideológica”. Essa campanha de perseguição, sinistramente chamada de “Escola Sem Partido”, criou um sentimento de intimidação e medo nas instituições educacionais de um país a apenas três décadas de um regime militar opressivo. No mês passado, Bolsonaro sugeriu que o Estado censurasse livros didáticos para promover valores conservadores.
O governo Bolsonaro deixou claro que não tolerará desvios de sua política e visão de mundo ultraconservadoras. No ano passado, o governo demitiu o diretor de marketing do Banco do Brasil, Delano Valentim, por criar uma campanha publicitária promovendo a diversidade e a inclusão, que foi censurada pelo governo. Mais tarde naquele ano, enquanto a floresta amazônica do Brasil queimava em um ritmo alarmante, o governo de Bolsonaro retaliava contra cientistas que ousavam apresentar fatos. Ricardo Galvão, ex-diretor do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), foi afastado de seu posto por divulgar dados de satélite sobre desmatamento na Amazônia.
O governo também é perigosamente hostil à mídia. Em 21 de janeiro deste ano, o promotor federal abriu uma investigação infundada ao jornalista americano Glenn Greenwald e sua equipe por participar de uma suposta conspiração para invadir o celular das autoridades brasileiras. A promotoria, um claro ataque à liberdade de imprensa, foi uma resposta a uma série de declarações que Greenwald e a Intercept publicaram sobre uma possível corrupção no círculo interno de Bolsonaro.
Apoio ao Nazismo
Esse não é um caso isolado. Oficiais do governo em todo o país, dos tribunais regionais à polícia militar, decidiram defender ideologicamente Bolsonaro e reduzir a liberdade de expressão. Somente em 2019, houve 208 ataques a mídia e jornalistas no Brasil.
Em 16 de janeiro, Bolsonaro e o então secretário especial da Cultura, Roberto Alvim, filmaram uma transmissão conjunta que expôs seus planos ideológicos para o país. Eles elogiaram a “virada conservadora” e a “retomada da cultura” no país. No dia seguinte, Alvim foi além: durante um segmento de vídeo para anunciar um novo prêmio nacional de artes, ele fez claras alusões aos princípios nazistas e levantou frases do propagandista nazista Joseph Goebbels.
A indignação doméstica e a condenação internacional levaram Alvim a renunciar. Mas Alvim estava apenas dando voz ao projeto político de extrema-direita de Bolsonaro, que continua com força total: uma afronta contínua à liberdade de expressão, justificada em nome da cultura nacional. Instituições públicas que representam o patrimônio multicultural do Brasil – Conselho Superior de Cinema, Ancine, Fundo Audiovisual, Biblioteca Nacional, Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) e Fundação Palmares para a Cultura Negra – enfrentaram censura, cortes no financiamento e outra pressão política.
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A cineasta brasileira Petra Costa, diretora do documentário “Democracia em Vertigem”, atualmente tem a chance de se tornar a primeira diretora latino-americana a ganhar um Oscar. No entanto, o secretário de comunicação de Bolsonaro recentemente usou seu canal oficial no Twitter para divulgar um vídeo atacando Costa, como uma mentira antipatriota. Da mesma forma, os longas-metragem “Bacurau”, “A Vida Invisível e Eunice Gusmão” e “Babenco” receberam aplausos internacionais nos festivais de cinema de Cannes e Veneza, mas Bolsonaro declarou que não há bons filmes produzidos no Brasil há muito tempo.
Retrocesso nas políticas afirmativas
O governo Bolsonaro também está trabalhando para reverter várias realizações sociais importantes das últimas duas décadas, incluindo ações afirmativas. Entre 2003 e 2017, a proporção de estudantes negros ingressando nas universidades brasileiras aumentou 51%; o regime Bolsonaro quer reverter esse progresso. Bolsonaro e seus ministros costumam menosprezar as minorias étnicas e a comunidade LGBTQ + – enquanto ignoram a violência e a criminalidade das milícias paramilitares de direita.
Este é um governo que não possui plano de desenvolvimento para seu povo. Em vez disso, o regime Bolsonaro está envolvido em uma perigosa guerra cultural contra ameaças internas artificiais. Nega o aquecimento global e a queima da Amazônia, despreza os líderes que lutam pela preservação do meio ambiente e desrespeita a cultura