Por Pedro Doria, de O Globo – Ao contrário do que o discurso da esquerda faz parecer, o eleitorado que levou Jair Bolsonaro à presidência não é homogêneo. Nem todos estão na extrema-direita, mas todos representam facetas diferentes, algumas novas, outras antigas, do conservadorismo brasileiro. Ao longo da campanha e como presidente, Bolsonaro sempre demonstrou habilidade para enviar recados específicos para cada um destes grupos. Com a saída de Sérgio Moro do Ministério da Justiça, corre o risco de perder um dos mais influentes nacos desta base.
Quando Bolsonaro fala de armas e pede pela exploração da Amazônia, se queixa de regras ambientais, ele está falando com uma nova classe média — a classe média agro. De 1985 para cá, com o crescimento do agronegócio a partir da globalização, este Brasil do interior que inclui Paraná, Santa Catarina, São Paulo, um pedaço de Minas Gerais e do Centro-Oeste cresceu muito.
Quando fala de religião, se queixa de feministas ou do movimento LGBT, Bolsonaro conversa com outra classe média — uma classe média baixa, também de recente ascensão, nas periferias das grandes metrópoles brasileiras. Em geral, são evangélicos. O PT a chamava de Classe C.
Mas não são apenas estes grupos que estão na base. Alguns, como os operadores do mercado financeiro, não representam muitos votos mas têm dinheiro. Seu apoio a Bolsonaro está atrelado à política econômica de Paulo Guedes.
A classe média urbana tradicional, no Brasil, desde a década de 1940 se divide entre uma centro-esquerda e uma centro-direita. E o grupo à direita há muito percebe na corrupção o problema central do país. Não foram poucos os políticos que exploraram este eleitorado — Jânio Quadros, Carlos Lacerda, Fernando Collor. Na Lava Jato, este grupo viu pela primeira vez seus anseios materializados: políticos sendo presos por corrupção.
É Sérgio Moro quem representa este processo, não Jair Bolsonaro. Quando, simultaneamente, Bolsonaro se alia ao Centrão e rompe com Moro, ele se expõe a perder este eleitorado. E, com ele, sua identidade como presidente.