
Por Ricardo Antunes
Se qualquer cidadão comum como esses que se vê na rua, eu ou você, descumprisse uma determinação de um juiz, seja ele qual for, o resultado seria bem diferente. O fosso que separa a elite e os poderosos no Brasil só podia produzir esse tipo de anomalia e promover esse vexame histórico. O professor Eugênio Bucci analisa os recentes fatos e concorda comigo: Foi um vexame. Veja o artigo que trago paqui para nossos leitores.
“Na quinta-feira, o Poder Judiciário expediu uma ordem e, na sexta, não deu conta de fazer com que sua ordem fosse cumprida. Na quinta-feira, o juiz Sergio Moro decretou a prisão do ex-presidente Lula, dando a ele um prazo para que se entregasse voluntariamente. Na sexta-feira, às 17h, o prazo expirou, e Lula nem aí.
Ou logo ali. Lula se hospedou na sede do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, em São Bernardo do Campo, para onde escorreu um rio caudaloso de bandeiras vermelhas. À frente do prédio, oradores bradavam palavras de ordem. “Marisa, guerreira, da Pátria brasileira”, “Lula livre”, “Não vai prender”, “Não tem arrego”. A massa exultava. Lula acenou da janela do prédio, sorridente. Estava bem guardado, acolhido, homenageado pelos seus seguidores
Ontem, dia 6 de abril de 2018, a fissura mortal que transpassa o Brasil ficou escancarada. Contra o poder do Estado, outro poder se insurgiu. Justa ou arbitrária, formalista ou humanista, pouco importa, a mão do Poder Judiciário bateu contra um muro — um muro de gente fula da vida.
A pusilanimidade togada está nua. A mais altiva e competente magistratura também está. Talvez uma e outra se recomponham logo mais. Talvez Lula se entregue. Talvez surja aí outra versão de habeas corpus. Vai saber. A situação nacional se reduziu a uma roleta russa. Não faz diferença quem tem razão. Ninguém tem razão. Ontem ficou patente que os poderes do Estado, no Brasil, tão esnobes, podem menos que uma sede de sindicato.”
Eugênio Bucci é professor de Comunicação da USP.






