Por Daniela Lima, do UOL – O governo do Rio de Janeiro dispensou o trabalho dos peritos da Polícia Federal na autópsia dos corpos dos 117 mortos em confronto com a polícia do Estado nos complexos do Alemão e da Penha, na capital fluminense. No total, 121 pessoas perderam a vida. Quatro policiais estão entre as vítimas. A operação entrou para a história como a mais letal do país.
O envio de 30 peritos federais foi anunciado pelo ministro Ricardo Lewandowski (Justiça) após um acerto prévio com o governador Cláudio Castro, na quinta-feira passada, dia 30. Na noite do mesmo dia, porém, a cúpula da Segurança do Rio informou o Ministério que a atuação da PF nessa frente não seria necessária.
Segundo a coluna apurou, em mensagem de texto, a Secretaria de Segurança do Rio disse que as equipes da Polícia Civil do Rio e do Ministério Público do Estado já tinham finalizado a necropsia dos corpos e que, por isso, governo do Estado e governo federal poderiam “avançar em outros assuntos”.
A afirmação, porém, não coincide com dados divulgados oficialmente por órgãos do Estado. No mesmo dia em que o secretário do Rio afirmou ter finalizado os trabalhos de autópsia, famílias de mortos na operação fizeram um protesto em frente ao Instituto Médico Legal (IML) do Rio cobrando a identificação e liberação dos corpos. Em nota, registrada por diversos veículos, o IML informou que, até ali, havia analisado 80 das 121 vítimas.
Oficialmente, o trabalho de perícia só foi concluído no último domingo (2), quando o governo do Estado divulgou nota com os nomes de 115 dos 117 suspeitos.

A autópsia é passo fundamental para determinar as circunstâncias das mortes. Familiares dos assassinados relataram corpos sem cabeça, sem braços, com marcas de facadas e tiros na nuca —que pode sinalizar a execução de pessoas rendidas.
Ao ser informado da recusa, o ministro da Justiça voltou a falar com o governador, que teria alegado “uma falha de comunicação”.
No dia seguinte, sexta-feira (31), o secretário de Segurança do Rio, Victor Cesar Carvalho dos Santos, enviou um ofício ao Ministério da Justiça formalizando seu interesse no trabalho dos peritos da PF, mas apenas para “exame de confronto balístico e rastreamento do armamento apreendido nas mãos de criminosos locais e de outros Estados”.
Numa segunda frente, o Rio pediu apoio do “Instituto Nacional de Identificação (INI), também da Polícia Federal, no tocante à identificação dos criminosos dos demais estados envolvidos na operação realizada no dia 28/10/2025”.
Ou seja, o ofício restringiu a colaboração da PF à análise das armas dos suspeitos mortos —sem acesso à de policiais que atuaram na operação— e à identificação dos integrantes de organizações criminosas de outros Estados.
A delimitação dos trabalhos dos peritos escolhidos pela PF para atuar no Rio marca o primeiro ponto de estresse nas relações entre os governos estadual e federal, já que a intenção dos dirigentes da Polícia Federal era a de ajudar a elucidar as circunstâncias do confronto de maneira ampla.
A realização de uma perícia independente foi alvo de cobrança não só do presidente Lula, que ontem classificou o episódio como “matança”, mas também de organismos internacionais, como a ONU, especialmente pela altíssima letalidade da ação no Rio.
Procurado para explicar a dispensa dos trabalhos dos peritos da PF, o governo do Rio não respondeu até a publicação deste texto. Se houver manifestação, a reportagem será atualizada.









