*Por Rafael Torres — Recentemente, o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, determinou o bloqueio de perfis em redes sociais de influenciadores digitais.
À luz do que preconiza nosso ordenamento jurídico brasileiro, a mencionada decisão extirpar do cidadão o seu direito fundamental de “voz” faz com que a informação seja coibida de chegar ao público como um todo.
Em que pese os resquícios do autoritarismo ainda estejam de uma certa forma arraigados em nosso País, o Brasil não se encontra mais em uma ditadura como a do período militar, e apesar de a Constituição vigente garantir a liberdade de expressão, pouco se tem feito para controlar esse abuso.
A ordem jurídica, instaurada em nosso sistema atual, não respalda qualquer manifestação no sentido do qual adotou o Ministro Alexandre de Moraes. A lei 12.965/2014 ressalta a possibilidade de indisponibilidade de conteúdo que seja dotado de ofensividade à honra de terceiros, entretanto, em nenhum momento há nos termos da referida legislação a possibilidade de bloqueio integral do perfil em redes sociais.

Observemos:
Art. 19. Com o intuito de assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura, o provedor de aplicações de internet somente poderá ser responsabilizado civilmente por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros se, após ordem judicial específica, não tomar as providências para, no âmbito e nos limites técnicos do seu serviço e dentro do prazo assinalado, tornar indisponível o conteúdo apontado como infringente, ressalvadas as disposições legais em contrário.
§ 1º A ordem judicial de que trata o caput deverá conter, sob pena de nulidade, identificação clara e específica do conteúdo apontado como infringente, que permita a localização inequívoca do material.
§ 2º A aplicação do disposto neste artigo para infrações a direitos de autor ou a direitos conexos depende de previsão legal específica, que deverá respeitar a liberdade de expressão e demais garantias previstas no art. 5º da Constituição Federal.
§ 3º As causas que versem sobre ressarcimento por danos decorrentes de conteúdos disponibilizados na internet relacionados à honra, à reputação ou a direitos de personalidade, bem como sobre a indisponibilização desses conteúdos por provedores de aplicações de internet, poderão ser apresentadas perante os juizados especiais.
§ 4º O juiz, inclusive no procedimento previsto no § 3º, poderá antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, existindo prova inequívoca do fato e considerado o interesse da coletividade na disponibilização do conteúdo na internet, desde que presentes os requisitos de verossimilhança da alegação do autor e de fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação.
É um direito legitimo dos influenciadores digitais o uso dos seus perfis perante as redes sociais. Comportamento que venha restringir a disseminação de um conteúdo inofensivo, indiscutivelmente, estará diante de uma censura prévia, que de acordo com o MICHAELIS.UOL.COM.BR, apresenta a seguinte definição:

“Censura prévia, JUR: exame antecipado, de caráter proibitivo, que o Estado faz em obras, geralmente de cunho artístico, a fim de proibir suas apresentações ou publicações: “[…] não submeterão os livros deles à censura prévia e não acontece nada e tudo fica por isso mesmo e a lei vira letra morta” (JU).”
Depreende-se que a liberdade de expressão é direito genérico que finda por abarcar um sem-número de formas e direitos conexos e que não pode ser restringido a um singelo externar sensações ou intuições, com a ausência da elementar atividade intelectual, na medida em que a compreende. Dentre os direitos conexos presentes no gênero liberdade de expressão podem ser mencionados, aqui, os seguintes: liberdade de manifestação de pensamento; de comunicação; de informação; de acesso à informação; de opinião; de imprensa, de mídia, de divulgação e de radiodifusão.
Com efeito, correto é o magistério de NUNO E SOUZA, para quem “A liberdade de informação possui uma dimensão jurídico-colectiva, ligada à opinião pública e ao funcionamento do Estado democrático, e um componente jurídico-individual; protege-se o legítimo interesse do indivíduo de se informar a fim de desenvolver a sua personalidade; não só o princípio democrático explica tal liberdade, também releva o princípio da dignidade humana”.

A decisão do ministro Alexandre de Moraes não possui guarida frente ao sistema normativa até então vigente. É preciso que a matéria seja urgentemente levada ao plenário da Corte, para que dissolva a decisão que determinou a suspensão dos perfis em redes sociais.
Há, ainda, a necessidade de que a Ordem dos Advogados do Brasil se manifeste, que seja combativa, a fim de rechaçar a manutenção dessa absurda decisão. Este importante órgão de defesa das liberdades não deve se manter inerte, pois a permissão da violação desse fundamental direito dará margem para que amanhã todos os demais sejam colocados em situação semelhante.
Logo, em um Estado democrático de direito, o precioso direito de falar, se expor, manifestar, dentro dos limites constitucionais e legais, não pode ser exonerado, pois, do contrário, estaremos diante de um infeliz retrocesso.
Não podemos permitir a minimização das nossas tão suadas conquistas.
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*Dr. Rafael Torres é presidente da Comissão de Direito Penal da Associação Brasileira dos Advogados Criminalistas de Pernambuco (ABRACRIM-PE) e professor de Direito Penal e Processo Penal







