EXCLUSIVO, por Luiz Roberto Marinho – Não tem mais pizza, nem roda de samba, nem música sertaneja: após longa pendência judicial, a Arquidiocese de Olinda e Recife retomou a casa paroquial e a capela de velórios da Igreja de Nossa Senhora dos Remédios que alegravam a noite de Fernando de Noronha, há sete anos, transformadas em pizzaria e casa de shows. A ordem de despejo da Muzenza Gastronomia e Cultura começou a ser cumprida na quinta-feira (12).
Os próprios paroquianos (veja vídeo) se encarregaram de retirar o mobiliário da pizzaria e casa de shows, para desalento dos oito funcionários da Muzenza que moravam lá e agora não têm para onde ir. Uma funcionária, residente da ilha há 16 anos, se queixa de que a administradora de Noronha, Thallyta Figuerôa, sequer quis recebê-los em busca de uma solução para abrigá-los temporariamente. “Noronha não tem ponte e nem debaixo da ponte podemos nos abrigar”, ironizou ela ao Blog.
O despejo põe fim a uma novela que se arrasta há anos, opondo paroquianos e boêmios e frequentadores da noite. Os paroquianos se queixavam do barulho dos ensaios musicais perturbando as missas e das garrafas e lixo deixados nas cercanias da Igreja Nossa Senhora dos Remédios. Os donos da Muzenza alegavam que geravam emprego e renda e que a Arquidiocese nunca cuidou da casa paroquial e da capela de velórios.
O juiz João José Rocha Targino, titular da Vara Única de Fernando de Noronha, deu razão aos paroquianos, mas por outros motivos. Ordenou a desocupação sob a justificativa de que, embora não tombadas pelo IPHAN (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional), como a Igreja Nossa Senhora dos Remédios, a casa paroquial e a casa de velórios, construídas à época da igreja, em 1772, integram o conjunto arquitetônico da igreja. Aceitou a argumentação de risco à preservação do Patrimônio Histórico-Cultural da ilha.
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A Arquidiocese de Olinda e Recife alegou, por sua vez, que precisa dos dois imóveis para executar sua obra assistencial na ilha. No processo judicial para a retomada da casa paroquial e da casa de velórios, não faltou laudo do IPHAN atestando que a pizzaria e casa de shows descaracterizavam a ambiência da Igreja e o conjunto religioso.
O laudo do IPHAN constatou a construção de estrutura de palco com toldo de lona plástica; de estrutura com coberta em piaçava para mesas; de edificação anexa à capela onde fica o forno de pizzaria. “Esta descaracterização se dá pelo uso dos materiais (lona, piaçava, tijolos cerâmicos aparentes) e também pela volumetria das construções”, atestou o IPHAN.
A história da pendência começa pela concessão de TPU (Termo de Permissão e Uso) pela administração de Noronha, em 1988, ao ilhéu João Benício Barbosa, já falecido, renovado em 2002, para ocupar a casa paroquial e a capela de velórios como residência. A esposa dele, Maria do Carmo Dias Barbosa, a Dona Pituca, figura lendária na ilha, falecida em 2012, abriu nos imóveis o primeiro restaurante e a primeira pousada de Noronha. Em janeiro de 2017, os herdeiros alugaram os imóveis à pizzaria Muzenza, pelo valor de R$ 10 mil mensais.
Na sua decisão, o juiz João José Targino critica a administração da ilha por haver permitido desvio no uso do TPU, que só pode ser usado para outros fins que não o residencial com autorização expressa dela. Determinou, por isso, à administração de Noronha a revogação do TPU concedido em 1988, “considerando o flagrante desvio de finalidade dos permissionários”. Ganhou a Igreja, perderam os boêmios e pagodeiros.









