Do Vermelho – Antes de sair do PSL, a sigla com a qual se elegeu, Bolsonaro atirou contra o presidente da legenda, Luciano Bivar, chamando-o de “queimado”. A briga seria pelo controle dos recursos milionários do Fundo Partidário. O partido recebeu no ano passado R$ 87 milhões.
Como retaliação, segundo os meios políticos, Bolsonaro editou uma medida provisória para acabar com o seguro-obrigatório do DPVAT, pago todos os anos pelos donos de veículos.
A medida atingiria em cheio Luciano Bivar, que é acionista da Companhia Excelsior de Seguros, consorciada da Líder, responsável pela gestão do seguro DPVAT.
Auditória nas contas da Seguradora Líder, revelada na edição desta quarta-feira (15) do jornal Folha de S.Paulo, traz detalhes dessa relação promiscua do ex-partido de Bolsonaro com a gestão do seguro.
O relatório revela conversas de Whatsapp, trocas de emails e recibos de pagamentos que mostram a proximidade de antigos gestores da empresa com políticos ou pessoas próximas a eles.
“Tem destaque, em especial, o detalhamento de uma cadeia de relacionamentos que ligava a Líder ao diretório nacional do PSL no período analisado. A auditoria foi contratada pela atual direção para avaliar gestões anteriores, de 2008 a 2017”, diz um trecho da reportagem.
A matéria lembra que o PSL foi a sigla com a qual o presidente Jair Bolsonaro se elegeu e o filho e deputado Eduardo Bolsonaro continua filiado à legenda.
Os elos com o PSL identificados pela auditoria envolvem tantos integrantes em diferentes negócios que a KPMG incluiu no relatório final um desenho esquemático para detalhar as conexões.
Nele, a Líder, alguns de seus fornecedores e consorciados aparecem como parte de uma rede de contatos ligada diretamente ao diretório nacional do PSL. Pessoas ligadas à sigla citadas no relatório afirmam que o contato com a Líder é profissional.
Além da Companhia Excelsior de Seguros, da qual Bivar é sócio, aparecem no esquema o escritório Rueda & Rueda Advogados, que tem como sócio Antônio Rueda, vice-presidente do PSL, e a SaudeSeg Sistema de Seguros, que tem cinco acionistas atuando no diretório nacional PSL.
Fluxogramas financeiros traçados pela KPMG mostram a Líder transferindo, de 2009 a 2016, R$ 94 milhões para empresas do diagrama. Desse total, a SaudeSeg ficou com R$ 72 milhões, valores repassados de 2012 a 2016.
Em paralelo, políticos listados no diagrama receberam, para campanhas eleitorais, R$ 330 mil em 2014 e R$ 75 mil em 2016 em doações de pessoas e empresas que têm alguma ligação com a Líder.
Os valores não estão corrigidos. Entre os acionistas da SaudeSeg, a auditoria destacou Rodrigo Gomes Furtado, com 40% de participação. Furtado aparece no relatório como sócio da Nox Entretenimento, que também tinha entre os sócios Cristiano Petribu Bivar, filho de Luciano Bivar.
CPI do DPVAT
O outro acionista mencionado, com 39% das ações da SaudeSeg, foi Ricardo Motta Lobo, apontado no relatório como tesoureiro do PSL. Um elemento importante para a construção do diagrama foi o registro de mensagens de celulares que mostravam contatos entre a Líder e políticos durante a CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) do DPVAT.
A CPI iniciou os trabalhos em julho de 2016 e teve sua última reunião em setembro do mesmo ano. Sem emitir parecer, foi oficialmente encerrada em janeiro de 2019. Ao longo de seu levantamento, a KPMG teve acesso aos celulares de diretores da Líder.
Diz a reportagem que chamou a atenção dos auditores uma série de arquivos de imagens que estavam no celular do ex-diretor jurídico da Líder Marcelo Davoli. Eram capturas de tela (prints) de conversas favoráveis à seguradora em meio à CPI do DPVAT —guardadas como espécies de arquivos.
Pelas avaliações da KPMG, as mensagens de celular trazem citações ligadas ao andamento da CPI e sua possível suspensão envolvendo parlamentares do PSB e do PSL. Nos registros localizados no celular há trocas de mensagens com uma pessoa identificada como “Sen. Fernando Bezerra”. Essa pessoa afirma que alinhou o tema com o PSB e que a CPI do DPVAT não seria prorrogada. Acrescenta que o partido seria contra, caso o tema chegasse ao plenário.
A avaliação da consultoria é que trata-se do senador Fernando Bezerra (PSB-PE). O interlocutor dessa conversa é identificado como “Rueda”. “Rueda”, segundo a KPMG, pelas indicações, tratava-se de Antônio Rueda, o vice-presidente do PSL, sócio do Rueda & Rueda Advogados.
Segundo a auditoria, entre 2014 e 2017, o escritório recebeu quase R$ 30 milhões de pagamentos da Líder. Na política, Rueda é considerado o homem forte do presidente do partido, Luciano Bivar.
Em reunião em novembro de 2016, o conselho de administração da Líder recomendou um aumento significativo dos valores pagos ao Rueda e Rueda. A partir dessa decisão, os pagamentos para o escritório foram elevados de R$ 1,5 milhão em 2014 para R$ 13,4 milhões em 2016. Em paralelo, a CPI do DPVAT estancou.
Após uma reunião em setembro daquele ano, foi desmobilizada, sem emitir nenhum parecer até o seu arquivamento, em 2019. Em outra mensagem guardada no mesmo celular do diretor jurídico, o tema da conversa era o convite da CPI para que membros do conselho de administração da Líder prestassem esclarecimentos na comissão.
O interlocutor afirma que isso “não é um indicativo favorável” e pergunta se é possível reverter a situação. Em resposta, recebe um “ok, amigo, combinado” da pessoa de nome Marcos Rogério.
São ainda reveladas ligações de parlamentares do DEM e PSDB na não prorrogação da CPI. A KPMG destaca que um parlamentar chamado Marcos Rogério (DEM-RO) representou seu partido na CPI.
Diz o texto do relatório: “Não foi possível identificar detalhes sobre os interlocutores da conversa, porém foi constatado que um parlamentar com cargo de deputado federal pelo DEM-RO, representa seu partido na CPI do DPVAT e tem o nome de sr. Marcos Rogério”.
Em mais uma conversa, uma pessoa com o mesmo nome do deputado Daniel Coelho (PSDB-PE), representante de seu partido na CPI como suplente, diz que o PSDB está com posição fechada contra a prorrogação da investigação no DPVAT.
Em nota ao jornal, Luciano Bivar negar qualquer relacionamento com os antigos gestores da Líder. “Sou meramente signatário do convênio do DPVAT”, diz.