Por Ricardo Antunes — O Hélio é um bom cronista. Ao destilar seu desejo mórbido contra o presidente Bolsonaro, no entanto, ele se iguala aqueles que bradam a favor do fechamento do STF e do Congresso com uma diferença:
Alguns foram presos e Hélio está exercendo sua “liberdade de opinião” no grupo Folha de São Paulo, que por sinal, também leio todo dia. Hélio destila o ódio da esquerda que, muita gente da direita, também tem. O que é ruim para a liberdade de opinião. E mostra que o país está doente, mas não só de Covid-19.
Mas afinal, a tal liberdade tem ou não limite? Posso escrever desejando a morte de Alexandre de Moraes ou isso é um crime? Se for, a régua tem que ser para todos. Como a que usamos aqui nesse blog.
https://www.instagram.com/p/CCWhIf0BHhL/?igshid=wvx203qbc3v9
Leia a matéria de Hélio Schwartsman:
Jair Bolsonaro está com Covid-19. Torço para que o quadro se agrave e ele morra. Nada pessoal.
Como já escrevi aqui a propósito desse mesmo tema, embora ensinamentos religiosos e éticas deontológicas preconizem que não devemos desejar mal ao próximo, aqueles que abraçam éticas consequencialistas não estão tão amarrados pela moral tradicional. É que, no consequencialismo, ações são valoradas pelos resultados que produzem. O sacrifício de um indivíduo pode ser válido, se dele advier um bem maior.
A vida de Bolsonaro, como a de qualquer indivíduo, tem valor e sua perda seria lamentável. Mas, como no consequencialismo todas as vidas valem rigorosamente o mesmo, a morte do presidente torna-se filosoficamente defensável, se estivermos seguros de que acarretará um número maior de vidas preservadas. Estamos?
No plano mais imediato, a ausência de Bolsonaro significaria que já não teríamos um governante minimizando a epidemia nem sabotando medidas para mitigá-la. Isso salvaria vidas? A crer num estudo de pesquisadores da UFABC, da FGV e da USP, cada fala negacionista do presidente se faz seguir de quedas nas taxas de isolamento e de aumentos nos óbitos. Detalhe irônico: são justamente os eleitores do presidente a população mais afetada.
Bônus políticos não contabilizáveis em cadáveres incluem o fim (ou ao menos a redução) das tensões institucionais e de tentativas de esvaziamento de políticas ambientais, culturais, científicas etc.
Numa chave um pouco mais especulativa, dá para argumentar que a morte, por Covid-19, do mais destacado líder mundial a negar a gravidade da pandemia serviria como um “cautionary tale” de alcance global. Ficaria muito mais difícil para outros governantes irresponsáveis imitarem seu discurso e atitudes, o que presumivelmente pouparia vidas em todo o planeta. Bolsonaro prestaria na morte o serviço que foi incapaz de ofertar em vida.