Da Redação do Blog – Uma decisão do 11º Juizado Especial Cível do Recife condenou a delegada de polícia Natasha Dolci a pagar R$ 7 mil de indenização por danos morais ao servidor do Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE), Jorge Ehrhardt de Melo Neto.
O caso começou após a delegada publicar nos stories de sua rede social uma foto do servidor, feita em um bar, com a legenda: “Alô @policiacivildepernambuco. Manda alguém melhor para me investigar”. A postagem, que atingiu mais de 22 mil seguidores, insinuava que Jorge estaria vigiando a delegada a mando da corporação.

A Justiça considerou que a publicação expôs o servidor de forma vexatória, violando sua imagem e honra, além de obrigá-lo a prestar esclarecimentos em órgãos correcionais, como a Corregedoria da Polícia Civil e o Grupo de Operações Especiais.
Segundo a sentença, a conduta da delegada extrapolou os limites da liberdade de expressão, configurando abuso de direito, especialmente por se tratar de uma autoridade pública de quem se espera prudência e responsabilidade. Além da indenização, o juiz destacou o caráter pedagógico da decisão, para coibir práticas semelhantes no futuro. A delegada não compareceu à audiência.
Veja a decisão:
Tribunal de Justiça de Pernambuco
Poder Judiciário
11º Juizado Especial Cível e das Relações de Consumo da Capital
Processo nº 0049859-35.2024.8.17.8201
DEMANDANTE: JORGE EHRHARDT DE MELO NETO
DEMANDADO(A): NATASHA DOLCI
SENTENÇA
Vistos etc.
Trata-se de Ação de Indenização por Danos Morais em que o demandante, servidor do Poder Judiciário, alega ter tido sua imagem e honra violadas por publicação realizada pela demandada, Delegada de Polícia, em sua rede social de grande alcance.
Sustenta que a ré publicou sua foto com insinuações inverídicas de que ele a estaria vigiando, o que lhe causou graves constrangimentos e a necessidade de prestar esclarecimentos em órgãos correcionais.
Regularmente citada, a demandada não compareceu à audiência de conciliação, instrução e julgamento (ID 198571938). Posteriormente, peticionou arguindo a nulidade da citação (ID 208230251), tese rechaçada pelo autor, que alegou ciência inequívoca da ré sobre o processo (ID 210508004).
De plano, impõe-se analisar a suscitada nulidade do ato citatório, na medida em que a demandada argumenta que a citação postal, recebida pelo porteiro de seu condomínio, seria inválida.
A referida tese, contudo, não se sustenta.
O Código de Processo Civil, em seu art. 248, § 4º, estabelece expressamente a validade da entrega do mandado a funcionário da portaria responsável pelo recebimento de correspondência nos condomínios edilícios, tratando-se de norma que visa a conferir efetividade e celeridade aos atos processuais, em consonância com a realidade da vida moderna.
Ademais, ainda que se ignorasse a clareza do dispositivo legal, a validade do ato restaria evidenciada em razão da aplicação da Teoria da Ciência Inequívoca.
Com efeito, a finalidade da citação é levar ao conhecimento do réu a existência da demanda, sendo certo que, no caso dos autos, a prova documental de ID 210508005 é firme nesse sentido, haja vista que, em vídeo publicado em sua própria rede social, em 08 de janeiro de 2025, a ré afirma textualmente ter recebido a citação referente a este processo.
Logo, a partir daquele momento, a finalidade do ato foi plenamente atingida, não havendo que se falar em qualquer prejuízo à sua defesa, que deixou de ser exercida por sua própria deliberação.
Assim, rejeito a arguição de nulidade e, diante da ausência injustificada da ré à audiência, decreto a sua revelia, nos termos do art. 20 da Lei nº 9.099/95.
No mérito, a pretensão merece parcial acolhimento.
Consoante é cediço, a revelia, nos termos do art. 344 do CPC, gera a presunção relativa (juris tantum) de veracidade dos fatos alegados pelo autor, ou seja, não isenta o julgador de analisar o conjunto probatório e a verossimilhança das alegações.
Em outras palavras, o juiz deve julgar segundo sua livre convicção, com base nos elementos constantes dos autos.
No presente caso, contudo, forçoso é concluir que a presunção de veracidade encontra amparo nas provas documentais que instruem a petição inicial.
A responsabilidade civil subjetiva, fundamento do pleito indenizatório, exige a comprovação de três elementos essenciais, nos termos dos arts. 186 e 927 do Código Civil: o ato ilícito, o dano e o nexo de causalidade entre eles, sendo certo que todos se encontram devidamente configurados na situação dos autos.
O ato ilícito consiste na publicação da imagem do demandante (ID 189781218) em rede social de ampla divulgação, sem a sua autorização, acompanhada de texto que, de forma irônica (“Manda alguém melhor pra me investigar”), imputa-lhe a conduta de estar a vigiá-la, insinuando tratar-se de um policial disfarçado.
Ora, tal conduta viola frontalmente os direitos de personalidade do autor, notadamente sua imagem, honra e vida privada, protegidos pelo art. 5º, X, da Constituição Federal, extrapolando, porquanto extrapola manifestamente os limites da liberdade de expressão, configurando abuso de direito (art. 187, CC), agravado pelo fato de ser ela uma autoridade policial, de quem se espera especial prudência e respeito aos direitos dos cidadãos.
O dano moral é patente e decorre in re ipsa, ou seja, da própria gravidade do fato ofensivo.
Isso porque a exposição vexatória da imagem do autor, associada a uma falsa imputação, perante um público de mais de 22.000 seguidores, é, por si só, suficiente para gerar abalo psíquico, angústia e constrangimento, somando-se a isso o dano concreto, comprovado pelos depoimentos prestados pelo autor na Corregedoria da Polícia Civil e no Grupo de Operações Especiais (ID 189781207 e ID 189781208).
Ser submetido a procedimentos de apuração interna, tendo que se explicar sobre uma situação criada por ato leviano de terceiro, representa um transtorno que ultrapassa, em muito, o mero dissabor cotidiano.
Finalmente, o nexo de causalidade é inquestionável, pois foi a publicação realizada pela demandada a causa direta e imediata de todos os danos sofridos pelo autor.
Resta, pois, a fixação do quantum indenizatório.
É certo que a indenização por dano moral deve obedecer aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, cumprindo uma dupla função: compensar a vítima pelo abalo sofrido e desestimular o ofensor da prática de atos semelhantes (caráter pedagógico-punitivo).
Considerando a gravidade da ofensa, a condição da ré como autoridade pública, a ampla repercussão da publicação e as consequências concretas na vida do autor, mas, por outro lado, atentando para o princípio que veda o enriquecimento sem causa, entendo que o valor de R$ 7.000,00 (sete mil reais) se mostra adequado e suficiente para reparar o dano e servir como medida pedagógica.
Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido, extinguindo o processo com resolução do mérito, nos termos do art. 487, I, do Código de Processo Civil, para CONDENAR a demandada a pagar ao demandante, a título de indenização por danos morais, o valor de R$ 7.000,00 (sete mil reais), com correção monetária pelo IPCA a partir da data desta sentença (Súmula 362, STJ) e de juros de mora mensais com base na taxa SELIC, descontado, contudo, o aludido índice de atualização monetária (art. 406 do CC), a contar do evento danoso (23/09/2024), nos termos da Súmula 54 do STJ.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
P. R. I.
RECIFE, 28 de agosto de 2025.
Juiz de Direito
O Outro Lado:
“Eu não aguento mais. Assina a porra dessa demissão”, desabafa delegada









