Do UOL – O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, anunciou hoje um “tarifaço” global sobre impostos de importação, com os produtos brasileiros sendo taxados em ao menos 10%. A data foi nomeada pelo republicano como o “Dia de Libertação”.
Ele anunciou sua nova política comercial, adotando a regra da reciprocidade entre os países. Para isso, portanto, adotará critérios de como os produtos americanos são taxados no exterior. A meta é a de começar a corrigir o déficit de US$ 1,2 trilhão que o país soma com o resto do mundo.
O que aconteceu
EUA vão impor tarifa de 25% sobre todos os carros importados a partir de 3 de abril. Já as autopeças serão taxadas a partir de 3 de maio. Hoje, a taxa é de 2,5%.
A forma de calcular será a de aplicar tarifas que representam metade do que os bens americanos são taxados. Por exemplo, o Japão coloca impostos de 46% em média contra bens americanos. A partir de agora, os americanos colocarão impostos de 24% sobre os bens japoneses. A lógica será usada com todos.
Durante o anúncio do tarifaço, Trump usou uma tabela para demonstrar as novas taxas aos países e a União Europeia.
- Tarifas aos países, segundo a Casa Branca:
- Brasil aplica 10%, vai receber em troca 10%
- China aplica 67%, vai receber em troca 34%
- União Europeia aplica 39%, vai receber em troca 20%
- Vietnã aplica 90%, vai receber em troca 46%
- Taiwan aplica 64%, vai receber em troca 32%
- Japão aplica 46%, vai receber em troca 24%
- Índia aplica 52%, vai receber em troca 26%
- Coreia do Sul aplica 50%, vai receber em troca 25%
- Tailândia aplica 72%, vai receber em troca 36%
- Suíça aplica 61%, vai receber em troca 31%
- Indonésia aplica 64%, vai receber em troca 32%
- Malásia aplica 47%, vai receber em troca 24%
- Cambodja aplica 97%, vai receber em troca 49%
- Reino Unido aplica 10%, vai receber em troca 10%
- África do Sul aplica 60%, vai receber em troca 30%
- Bangladesh aplica 74%, vai receber em troca 37%
- Singapura aplica 10%, vai receber em troca 10%
- Israel aplica 33%, vai receber em troca 17%
- Filipinas aplica 34%, vai receber em troca 17%
- Chile aplica 10%, vai receber em troca 10%
- Austrália aplica 10%, vai receber em troca 10%
- Paquistão aplica 58%, vai receber em troca 29%
- Turquia aplica 10%, vai receber em troca 10%
- Sri Lanka aplica 88%, vai receber em troca 44%
- Colômbia aplica 10%, vai receber em troca 10%
A base usada por Trump para aplicar uma tarifa de 10% ao Brasil teria sido a avaliação por parte da Casa Branca de que o país adota uma taxa também de 10% contra bens americanos. Mas tanto o governo como o setor privado contestam o dado. O imposto, na avaliação do Brasil, seria de 2,7% em média para bens americanos.
Para fazer o cálculo de 10%, os americanos calcularam não apenas as tarifas aplicadas pelo Brasil. Também foi contabilizada a barreira não tarifária, obstáculos tributários e outras medidas que dificultam as vendas de bens dos EUA no mercado nacional.
O anúncio deixou o setor privado brasileiro com um sentimento misto. “É ruim, mas é bom”, afirmou um negociador das empresas nacionais. O ponto positivo é que outros terão tarifas mais altas e que o Brasil ficou no piso adotado pela Casa Branca.
A perspectiva é de que, quem negociar primeiro, acabará tendo vantagens no mercado americano. Retaliações, portanto, não seriam o caminho mais óbvio para o Brasil. O temor é de que outros ofereçam acordos mais favoráveis aos bens americanos.
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O anúncio
Republicano definiu o decreto como histórico e afirmou que o tarifaço é uma ação “recíproca” com os outros países, que ele diz estarem roubando os EUA. “Agora é a nossa vez de ficarmos prósperos. A nossa dívida será paga e tudo isso ocorrerá de forma muito rápida”, disse, acrescentando que irá fazer os “EUA ricos novamente”, retomando o “sonho americano”. O anúncio foi feito em um evento, aberto a algumas pessoas e à imprensa, no lado externo da Casa Branca.
Em discurso, ele afirmou que, por décadas, outros países impunham tarifas altíssimas aos EUA, “inclusive com barreira não monetárias para dizimar a nossa indústria”. O presidente norte-americano comentou que, em muitos casos, as limitações não monetárias eram piores que as monetárias: “Eles manipularam as suas moedas, subsidiaram as suas exportações, roubaram nossa propriedade intelectual e impuseram taxas absurdas com regras injustas”, acrescentou.
Trump usou o anúncio para atacar líderes estrangeiros por estarem “roubando” os EUA, indicando que a agricultura americana estaria sendo “brutalizada” por outros países, mas que a partir de agora ela será reforçada. “Será, de fato, a era de ouro dos EUA voltando. Estamos voltando muito fortes.”
Agora não é tarde demais. Nós começaremos a ser mais espertos, inteligentes, e voltaremos a ser ricos. Porque tanto da nossa riqueza foi tirada de nós e não podemos deixar isso acontecer. Nós podemos ser tão ricos, mais que qualquer outro país. Mas precisamos ficar espertos porque os EUA não podem ficar com tarifas unilaterais, nessa rendição econômica.
Donald Trump, ao anunciar as tarifas
No início da semana, o governo Trump tem feito sinalizações ao setor empresarial norte-americano e ao mercado financeiro. A gestão reforçou que o objetivo do tarifaço é forçar países a negociar uma maior abertura aos produtos norte-americanos.
Mais cedo, autoridades da Itália, da França e do Reino Unido começaram a discutir sobre possíveis respostas ao anúncio. Ontem, o Senado brasileiro aprovou um projeto de lei que estabeleceu mecanismos de reação, apesar de não citar diretamente os EUA.
Brasil seguirá negociando com os EUA
O colunista do UOL Jamil Chade apurou que o governo brasileiro continuará a negociar com os EUA, mesmo após o anúncio das tarifas. Num telefonema hoje, o chanceler Mauro Vieira e o representante de Comércio da Casa Branca, Jamieson Greer, estabeleceram que, depois de conhecer a taxa que será aplicada sobre o Brasil, as equipes dos dois países irão se reunir na próxima semana para continuar a negociar e tentar obter um acordo. Na conversa, foram ainda tratados temas como a tarifa ao aço.
A aposta pelas negociações era o caminho preferido pelo Brasil, com a tentativa de acertar uma redução de tarifas, cotas e isenções. Como o UOL revelou anteontem, não existem esperanças por parte do governo Lula e nem do setor empresarial de que o Brasil possa ser poupado do tarifaço.
Caso necessário, o Itamaraty considera que tem espaço legal para elevar as tarifas para os produtos americanos, sem violar os compromissos do país na OMC (Organização Mundial do Comércio). Pelas regras, o Brasil poderia subir as taxas para até 35%, sem incorrer em uma ilegalidade nos tratados. Um dos problemas é que tal medida poderia afetar as próprias empresas nacionais, que dependem desses produtos americanos. Uma das saídas, portanto, seria uma retaliação em serviços, remessas de royalties por empresas americanas e até no setor de propriedade intelectual.
O Brasil não está entre os maiores responsáveis pelo déficit americano. De fato, por anos, foram os EUA que tiveram vantagem no comércio. Ainda assim, nas conversas bilaterais, os americanos se queixaram de um tratamento injusto sobre o etanol dos EUA e barreiras como o sistema tributário.
Um terceiro caminho, ainda que simbólico, seria levar a disputa para a OMC. Governos como o do Canadá já adotaram a medida e a iniciativa teria como objetivo demonstrar que o Brasil atua pelas regras do comércio, e não por vias unilaterais. Mas com os mecanismos de solução de disputas inoperantes, qualquer ação na OMC levaria anos para trazer qualquer resultado.