Por Carlos Madeiro, no UOL — O prefeito do Recife, João Campos (PSB), dará neste domingo um passo a mais para nacionalizar seu nome na política brasileira. Às 14h em Brasília, ele será eleito por aclamação como novo presidente do PSB, assumindo o posto de Carlos Siqueira.
Não é segredo para ninguém que a popularidade digital do prefeito é tratada como um ativo do PSB para concorrer, em um futuro não tão distante, ao cargo de presidente.
“Ele é o principal investimento do PSB hoje, nosso principal ativo político. E nós estamos investindo nele” afirmou Carlos Siqueira em entrevista ao Podcast Direto de Brasília, na quarta-feira (28).
Namorado da deputada federal Tabata Amaral (PSB-SP), João é um político jovem, de 31 anos, que alcançou sucesso nacional em redes sociais. Ele é o que convencionou-se chamar de “nepo baby”. No caso, ele recebeu a herança de liderança familiar do PSB, seja pelo pai (Eduardo Campos), seja bisavô (Miguel Arraes) —que foram presidentes nacionais da sigla por longos períodos: Arraes entre 1993 e 2005, e Eduardo pai entre 2005 e 2014.

Visibilidade trará fiscalização maior
Ao mesmo tempo que a ascensão à presidência aumenta a visibilidade, o coloca também como um político mais visado e, por tabela, fiscalizado. “Tudo será examinado: sua gestão no Recife, sua passagem pelo Congresso Nacional, seus posicionamentos públicos, e até mesmo sua vida íntima e familiar”, afirma Arthur Leandro, cientista político da UFPE (Universidade Federal de Pernambuco).
Na quinta-feira, o colunista Flávio VM Costa, do UOL, revelou que o Tribunal de Contas de Pernambuco e o MPF (Ministério Público Federal) investigam indícios de irregularidades em contratos da gestão da Prefeitura do Recife com empresas de engenharia que prestam serviços de manutenção em escolas e unidades de saúde.
A denúncia, que poderia ter repercussão mais local, acabou ganhando escala nacional por conta de seu sucesso.
“A indicação ao PSB tem bônus, mas tem ônus –e isso depende muito dele. O comportamento que ele terá, os resultados políticos, mas também a própria relação que vai estabelecer ao longo desses próximos anos vão contar nesse resultado. Mas acho que, pensando no conjunto da obra, tem mais bônus do que ônus, e acho que João vai ter que saber administrar bem essa situação”, diz Luciana Santana, cientista política da Ufal (Universidade Federal de Alagoas)

Sucesso nas redes
A ascensão do prefeito do Recife passa muito pelo mundo digital. Ele tem 2,9 milhões de seguidores somente no Instagram. Para efeito de comparação, os prefeitos das maiores cidades do país —Ricardo Nunes (MDB), de São Paulo, e Eduardo Paes (PSD), do Rio— têm 1,1 milhão e 868 mil seguidores na mesma rede, respectivamente.
A facilidade em se conectar com o público jovem nas redes é apontado com um trunfo dentro da esquerda, que tem sofrido com a comunicação digital em todas as esferas. Por isso, Siqueira diz que João é a “pessoa certa” para dar continuidade “à auto-reforma, à modernização do partido”.
A ideia é que ele traga consigo uma nova forma de comunicação. Foi essa linguagem popular nas redes sociais que levou João a fazer sucesso fora do Recife e, para muitos especialistas, se tornou decisiva para a vitória acachapante na sua reeleição em 2024 com 78% dos votos válidos.
“Ele pode trazer propostas de desenvolvimento mais inovadores para os municípios, para os estados e, futuramente, para o próprio país. Ele é a pessoa jovem ideal para dar curso a esse programa, o que é uma tarefa monumental; digna dele, se tiver sucesso, se tornar candidato à presidência da República, o que é o nosso projeto”, diz Carlos Siqueira.
O UOL tentou conversar com João nos últimos dias, mas não conseguiu uma agenda. Em entrevista à Folha, João afirmou que a prioridade de sua gestão no PSB será fortalecer o partido em diversas vertentes. “É preciso ter força eleitoral”, disse.
A ideia é atrair mais políticos e lideranças de peso para dar mais força ao PSB. Foi assim que nos últimos anos o partido conseguiu nomes como do vice-presidente Geraldo Alckmin. “Não tenho nenhuma dúvida de que a gente vai ser um partido progressista com maior crescimento nas próximas eleições”, afirma.
“É preciso ter um diálogo forte em relação aos grandes centros urbanos, o problema da violência urbana é um grande problema hoje. É preciso compreender nichos do agro e comunicar o que está sendo feito.”, diz João Campos (PSB).

Eleição ‘simbólica’
Para o cientista político Arthur Leandro, a eleição de João à presidência do PSB representa, ao menos no plano simbólico, um movimento significativo na centro-esquerda brasileira.
“Ele entra no comando da sigla num momento em que o partido busca renovar sua identidade e ampliar sua presença no cenário nacional. E o faz com uma vantagem: já no momento da posse, o dirigente partidário com maior base digital entre os 29 presidentes de siglas brasileiras. O PSB tem assim a maior presença digital dentre as esquerdas brasileiras”, diz.
Mas a eleição vai além das redes sociais. “Há um cálculo político importante, ainda que não explicitado, nos documentos internos do partido: com a dificuldade crescente do PT em se renovar, e na ausência de um sucessor natural a Lula, João Campos se apresenta como um nome viável para assumir parte do protagonismo da centro-esquerda”.
“Essa pretensão, todavia, exigirá muito mais do que números de engajamento: exigirá articulação, capital político real, e um projeto nacional convincente. O momento do PSB, é verdade, é favorável: a legenda foi a que mais elegeu prefeitos no campo da esquerda nas eleições de 2024. Se bem conduzido, pode fazer do PSB um polo de atração para os eleitores desiludidos com o lulismo, mas ainda refratários à direita”, ,diz Arthur Leandro, cientista político da UFPE (Universidade Federal de Pernambuco).

Desafio passa por vitória em Pernambuco
Antes de pensar na Presidência, porém, João terá um duro desafio local. Ele deve renunciar à prefeitura do Recife em abril de 2026 para disputar o governo do estado e ocupar o lugar que pai e bisavô já estiveram.
João hoje lidera as pesquisas com vantagem confortável ante a governadora Raquel Lyra (PSD), candidata à reeleição. Segundo a Real Time Big Data, divulgada em 10 de abril, ele teria 67% votos, contra 22% da rival.
O grupo sabe, porém, que a disputa contra a máquina será dura e que a governadora, após um mau começo, tem melhorado os índices de aprovação no estado.
Uma estratégia de Raquel tem sido a aproximação com o presidente Lula. Recentemente se filiou ao PSD, deixando o PSDB que a elegeu duas vezes prefeita de Caruaru e ao governo do estado.

Na quarta-feira, Raquel e João dividiram palco no evento em Salgueiro (PE) com a presença de Lula. Única dos dois a falar, foi bastante aplaudida pelo público ao ser anunciada. Quando citou o nome de Campos, ouviu um coro de gritos e palmas, mas seguiu o protocolo citando os demais prefeitos presentes.
Raquel começou o seu discurso rasgando elogios a Lula pelas obras no estado, fez postagens nas suas redes sociais com Lula e tenta neutralizar o provável apoio do presidente a João em 2026. Em 2022, ela se elegeu contra Marília Arraes (Solidariedade) em cima do muro entre Lula e Bolsonaro.
Já João deve contar com o apoio formal do PT na chapa e goza de grande prestígio com o presidente Lula e com boa parte do partido em Pernambuco. Por isso, o grupo acredita que Lula não iria se sentir com “palanque dividido”, como ocorrerá em outros estados.









